Idas e vindas na desertificação da Caatinga

Caatinga: o único Bioma 100% brasileiro

O Brasil já perdeu 34 milhões de hectares (40%) dos 82,6 milhões de hectares da Caatinga, alertou o presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Rodrigo Agostinho, durante a participação em um seminário técnico-científico sobre o bioma.

O caminho para a desertificação do Bioma

1 – Diagnósticos sobre o problema existem aos borbotões:

“Agostinho destacou as características que apontam a necessidade de uma política pública específica para o bioma, como o alto grau de espécies exclusivas que já passaram por transformações pela atividade humana. ”

“A caatinga tem 60% de área de vegetação nativa ocupada, das quais uma boa parte já passou por processo de antropização (atividade humana) seguidos, como corte raso, queimas reiteradas, extração seletiva de vegetação e animais, introdução de espécies exóticas”, afirma.

Em decorrência dessa ocupação, já são sentidos efeitos como a desertificação de mais de 10% do bioma (mais de 8 milhões de hectares), o que na visão de Agostinho deve ser enfrentado com a criação de unidades de conservação, recuperação da vegetação nativa e criação de dados de conservação para proteção integral e uso sustentável.

A melhoria dos licenciamentos ambientais e a demarcação dos territórios das populações tradicionais foram outras necessidades elencadas pelo presidente do Ibama. “Temos muita população tradicional e que normalmente não é reconhecida, como o sertanejo, e isso é um desafio, porque, de repente, chega um empreendimento e essas pessoas são expulsas de suas áreas rapidamente”, ressaltou.

Foto: Wikipédia

2 – Pesquisas e estudos científicos sobre o problema e suas possíveis soluções, sobram:

 Num evento realizado em Petrolina, Pernambuco, nessa segunda-feira (10/06), durante o lançamento da campanha Terra, Floresta, Água – Movimento Nacional de Enfrentamento à Desertificação e à Seca (*), houve o lançamento do livro “Manejo Florestal da Caatinga – 40 anos de experimentação” (**). O livro, que reúne o conhecimento científico acumulado nos últimos 40 anos por dezenas de cientistas de inúmeras instituições, oferece elementos e subsídios que podem contribuir na formulação de políticas públicas, notadamente para o enfrentamento à desertificação e às mudanças climáticas, incluindo aporte técnico e científico para o aprimoramento das práticas de implementação, monitoramento e uso sustentável de florestas no bioma Caatinga, tendo-se como referência os planos de manejo florestal.

“A importância da publicação é ampliada quando se considera que os seus conteúdos são estratégicos, enquanto material técnico e instrutivo de interesse na formação e atuação profissional de técnicos, extensionistas e gestores públicos envolvidos na gestão ambiental e desenvolvimento florestal.

Além disso, importa como fonte de consulta e conhecimento técnico atualizado para pesquisadores e profissionais das ciências ambientais e florestais. Dezenas de pesquisas sobre Manejos Florestais Sustentáveis no Bioma”, destacou a Ministra Marina Silva do Ministério do Meio Ambiente (MMA).

Foto: Mateus Pereira/Governo da Bahia

3 – O que falta então para implementar as soluções?

Segundo anunciou a Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, no evento realizado em Petrolina, Pernambuco, “mais de um milhão de hectares serão protegidos no bioma por meio da criação de 12 unidades de conservação federais na Caatinga”.

A criação dessas Unidades de Conservação (UC) é importante para a preservação de áreas remanescentes da vegetação nativa, porem essas Unidades dependem de recursos para sua manutenção e fiscalização para que cumpram seus atributos. Neste sentido, sabemos que a maioria das UCs existentes passam por sérias dificuldades.

Apesar do Presidente do IBAMA, Rodrigo Agostinho, citar que: ““No ano passado nós retomamos a fiscalização da Caatinga, retomamos as nossas ações com força, com estratégia, ampliamos os autos de infração em 69%, ampliamos as multas em quase 600% só no bioma, ampliamos os embargos, que é, talvez a estratégia mais importante no combate ao desmatamento, ampliamos a apreensão, mas o que a gente percebe é que a gente precisa de estratégias robustas para fazer o enfrentamento”, entre 2022 e 2023 foram desmatados mais de 342.324 hectares de vegetação nativa, dos quais, grande parte, são sérios candidatos à incrementação de áreas desertificadas.

Esse desmatamento desenfreado, associado às queimadas criminosas ou não, e o aquecimento global, são os principais fatores da “descaatingação” da Caatinga citado pela Ministra “Os estudos da ciência estão nos mostrando que já temos uma ampliação das áreas que eram semiáridas e que estão ficando áridas. Isso é mudança do clima. Se a gente ‘descaatinga’ a Caatinga, a gente agrava o problema”.

No segundo capítulo do livro lançado pelo MMA, “DINÂMICA DA COBERTURA FLORESTAL E OUTROS USOS DA TERRA NO BIOMA CAATINGA”, os cientistas explicam o uso da terra no Bioma com base nos seguintes dados estatísticos que entre 1985 e 2017. Não há informações sobre o período de 2018 até os dias atuais nos quais o desmatamento das florestas subiu vertiginosamente.

Dinâmica da cobertura e uso do solo no bioma Caatinga

Dinâmica do uso do solo

Fonte: PROJETO MAPBIOMAS, 2019

“Várias são as causas desta dinâmica dos usos da terra, contrária às previsões e prognósticos prévios. Por um lado, ocorreu a extinção da agricultura itinerante de algodão arbóreo, sisal e outras culturas plurianuais e a redução de áreas de lavouras anuais, causada pela sua baixa rentabilidade e pela diminuição da fração ativa da população rural. As áreas de lavoura abandonada viraram pastagens, capoeiras e finalmente matas secundárias como resultado da sucessão secundária. Aliás, as áreas não vegetadas não aumentaram, sugerindo que processos de desertificação extrema não ocorreram em grande escala.

Por outro lado, a presunção de que a extração não autorizada de lenha era a causa do desmatamento estava basicamente errada, porque o corte da lenha era (e ainda é) praticado em áreas abertas para a agricultura ou pastagens, com uma sequência de usos da terra: lavoura> pasto aberto > pastejo na capoeira > pastejo nas matas secundárias. Assim, devido à estagnação da área total de agricultura e pastagens desde 1995 até 2021, a área ocupada por florestas no bioma caatinga ficou praticamente constante, em um equilíbrio dinâmico com outros usos da terra. Logo, a maior parte da cobertura florestal atual na caatinga é de matas secundárias, com vinte a sessenta anos de regeneração. A mesma situação era, provavelmente, a prevalente desde fins do século XIX e início de século XXI.”

Se analisarmos os números oficiais, apresentados até aqui, pelo MMA e pelos diversos órgãos de observação do Bioma, podemos observar  que nos 34 milhões de hectares que perderam sua cobertura natural nos últimos 140 anos há indícios de que o problema secular vem se arrastando no lastro de uma ausência de políticas públicas. “De 1880 até meados de 1980, a lavoura de algodão arbóreo era o uso mais rentável da terra no semiárido, gerando contínuas mudanças de uso do solo, necessárias para manter a viabilidade do sistema de produção de algodão consorciado com lavouras anuais, que devia renovar suas roças a cada cinco anos. O desmatamento itinerante era considerado uma causa de degradação dos solos e da diminuição da cobertura florestal. Era também a principal fonte de lenha e carvão para a indústria e o comércio no Nordeste. ”(*)

Janela para o presente da Caatinga

Por enquanto, as notícias que temos de soluções que estão sendo encaminhadas resumem-se ao Projeto Conecta Caatinga, para promover a gestão integrada da paisagem no bioma, por meio de ações de recuperação da vegetação nativa e dos corpos hídricos, estimulando o desenvolvimento de uma sociobioeconomia de baixo carbono e conectando a vegetação entras as áreas protegidas. Serão investidos R$ 30,2 milhões do Fundo Global para o Meio Ambiente (Global Environment Facility – GEF).

O Projeto Arca: áreas protegidas da Caatinga é outra iniciativa para a proteção do bioma por meio da expansão e consolidação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (Snuc), com envolvimento das comunidades locais visando a elaboração de planos de manejo das áreas de preservação nos estados da Bahia, Pernambuco e Piauí. Os investimentos de R$ 50 milhões já foram aprovados pelo Fundo do Marco Global pela Biodiversidade.

O MMA também constrói o Plano de Ação Brasileiro de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca e o Plano e o Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Caatinga. Ambos têm lançamento previsto para o segundo semestre. 

Por Paulo Machado – Editor do Portal EducaçãoSustentável

Com informações da Agência Brasil

(*) Acesse a campanha Terra, Floresta, Água – Movimento Nacional de Enfrentamento à Desertificação e à Seca em:

(**) Acesse o Livro em: https://www.gov.br/mma/pt-br/composicao/snpct/dcde/movimento-nacional-de-enfrentamento-a-desertificacao-e-as-secas/livro_manejo_florestal_da_caatinga_versao_ajustada_07junho24_menor.pdf

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